domingo, 23 de setembro de 2012

ao vencedor, as batatas


   "Ao vencedor, as batatas!"; eis o lema de Quincas Borba. Em 1886 Rubião foi criado por Machado de Assis como um professor simples de Barbacena, que de uma hora pra outra enriqueceu com a fortuna do amigo morto, lhe deixando ainda o cão amigo para cuidar (que também se chamava Quincas Borba) e a confusão dentro de si, não sabendo se deveria ficar triste ou contente com o ocorrido. Foi para o Rio de Janeiro usufruir de sua nova vida, porém o coração da pequena cidade de Minas permaneceu, ajudando a todos que simpatizava com boas quantias em dinheiro; ficou amigo de Palha, como se o conhecesse desde a infância! a mulher, Sofia, lhe dispensava olhares e delicadezas; Doutor Camacho jurou lhe fazer ministro, e não lhe faltava companhia para o almoço, muito menos convites para o jantar.  Os olhares da bela mulher o enfeitiçaram e, aos poucos, o amor não correspondido foi definhando o bom Rubião, da mesma forma que seu dinheiro foi se esgotando. A loucura veio, os amigos se foram.

 "Que será que lhes fiz? Não lembro de ter feito alguma coisa.. mas deve ter algo errado." pensava Rubião nos momentos de lucidez.

  Foi internado num sanatório por insistência de uma senhora bondosa, porém desconhecida, comovida com sua situação. Ficou sabendo que ele havia fugido da casa de saúde, e ninguém o encontrara, nem encontraria, pois havia voltado para Barbacena junto de Quincas Borba, que seguia o dono debaixo de chuva, morto de fome. Dias depois, pobre e louco, morreu abandonado. Quincas Borba fugiu a procura do dono que o deixara sozinho e foi encontrado morto três dias depois.

 Palha e Sofia, estavam cada vez mais ricos na capital. Não se lembravam mais da alma que os ajudou, e não sonhavam que era apenas isso que restara de Rubião.

Foi entrando no século XX que Machado de Assis escreveu essa história, e ainda hoje vejo um e outro Rubião pelas ruas, cercados por Palhas, Sofias e um mundo em que as batatas ficam com quem for mais esperto, ou menos humano.

De qualquer forma, ao vencedor, as batatas!



segunda-feira, 10 de setembro de 2012

ainda chove por aqui






Este final de semana tem sido atípico. Choveu tanto, mas tanto, que eu acho que ela levou consigo muito mais do que aquele abafamento dos últimos dias. Lavou lá fora e lavou aqui dentro também; essa agonia, esse sufoco que põe a gente pra baixo e só aflora nos dias de chuva.

O lá fora fica tão melancólico. Tão desafiador. A chuva me traz lembranças, algumas saudades, algumas vontades, e um sentimento muito profundo que, à noite, transborda. Nessas horas eu adoraria saber tocar violão. Esta é uma das coisas que está no topo da minha lista "O que fazer depois do vestibular": aprender a tocar violão. Sempre quis aprender; nunca me esforcei o bastante para tanto. Mas ele me pareceria perfeito para um final de semana chuvoso como o que passou. As cordas vibrando no ritmo do vento ao dedilhar uma daquelas canções que falam por si só, que expressam tudo aquilo que você gostaria de dizer. Sem pensar, instintivamente e, muito provavelmente, me veria chorando entre uma nota e outra. Sensibilidades que apenas a chuva traz. Lágrimas que rolam pelo rosto para acompanhar aquelas que brincam na janela. Minuciosas, vão desenhando sua forma por onde passam. Mudam de trajetória conforme o vento, vão parar na vidraça ao lado, na madeira ou na boca. Um gostinho levemente salgado. Salgado como o dia chuvoso, um dos poucos com cara de inverno de verdade.

Por enquanto, ficamos só eu e meu bom e velho Machado de Assis. Já é segunda-feira, e lá fora chove.

e na linda voz de Maria Gadú, essa música ainda mais linda

domingo, 2 de setembro de 2012

covardiamos.


    - A vida é uma merda. A gente gosta de quem não gosta da gente. E quem gosta da gente, a gente não gosta.

Quem nunca pensou isso que atire a primeira pedra. Essa foi a resposta de um amigo quando questionado por mim porque não ligara para a menina que ele saíra na noite anterior.

César não ligou porque não gostou da moça o suficiente para marcar um segundo encontro. Ela provavelmente esperou pelo retorno e ficou sem. Coisas da vida, um dia a gente sofre, no outro põe alguém a sofrer.

O gostar provoca diversas insatisfações e assim há sempre de ser. O amor tem mesmo dessas patifarias – muitas vezes separa o amante do objeto amado; e o objeto amado põe-se a amar um amante distinto que não necessariamente irá corresponder aos seus mais doces sentimentos.

De certa forma, isso pode ser bom. Não ter o amor correspondido significa que a pessoa sabe do seu interesse mas dele não compartilha. Mau é sentir amor e jamais saber qual seria a reação da pessoa se ela soubesse de tamanha estima. Cá entre nós, esse lema de que o que vale é a iniciativa é bobagem quando se trata de amor. No fundo, somos todos covardes que nos apaixonamos, guardamos e deixamos o tempo levar. Quem sabe assim a gente esqueça, o afeto passe e um novo amor apareça – dessa vez, já claramente apaixonado por nós e que nos poupe o esforço de dar o primeiro passo ou passar noites em claro a pensar sobre isso.

Frustra-se o humano ainda assim já que não é sempre que os amores que nos faltam o ar aparecem. daqueles que nos fazem pensar – eu poderia ficar a vida inteira com você. desde agora. e se soubesse. desde o começo.

e pelo silêncio eles se vão e passam distantes. são apenas vontades.

Covardes. Um bando deles.
Um monte de nós.

mais uma doçura de Às Claras.